Olhos vazios. Como é que eu não os via antes? Como é que não os encontrava se estão em todas as esquinas em todas as ruas? Tantos, tantos! Como é que só depois de os meus terem ficado cheios de nada (ou vazios de tudo...) é que eu os encontro por todo o lado? E os outros, pergunto-me se os outros, se a maioria, não os vê, não reparam. Olhares perdidos presos a nada. Demoram-se a olhar tudo. Ou pedaços do tudo. Cruzam-se olhares por instantes. Breves instantes apenas. E sabem. Sabem que aquele olhar é tal qual o seu. Vazio de tudo, cheio de nada. Depois bastam palavras perdidas no espaço, quase monossílabos para que se saiba tudo o que há para saber. Os olhares prendem-se de novo num ponto distante, invisível aos olhos dos conformados e a vida que parece arrastar-se nas pernas cansadas de caminhar por estradas que não se escolheram, segue. Segue sempre. Não fica à espera dos que tem o corpo anestesiado pelos sentidos, não segura as pontas dos cordéis das marionetas vivas que vivem por todo o lado e que eu não via antes. Tenho pena de todas as vezes, que encontro esses olhares em rostos fechados que travam duras batalhas interiores e em que saem sempre vencidos. São os caminhos que não escolheram. Caminhos que inventaram cruzamentos, só para baralhar e em que todos os semáforos estão verdes excepto no caminho certo. Para esse inventaram um sinal de perigo gigante, desenharam num placar um precipício e os seres da noite esconderam-se atrás à espera que haja um queda vertiginosa no precipício que não existe. Porque temos medo do que desconhecemos, porque os olhos vazios estão cheios de alguém ou de momentos e não conseguem ver para além do que não se vê.